Na maioria das vezes, os vencedores do Prêmio Nobel são indivíduos cujas descobertas e cujos trabalhos contribuíram de alguma forma para o avanço científico e cultural da humanidade. Entretanto, dissemos “na maioria das vezes” porque alguns dos indivíduos reconhecidos pelo comitê que concede a honraria tiveram atitudes ou fizeram alegações que vão contra a própria essência da premiação.
Mark Strauss, da National Geographic, reuniu algumas dessas figuras — que provaram ser racistas, falharam em reconhecer colegas cuja ajuda foi fundamental para seus estudos, usaram seu conhecimento para fazer o mal etc. —, e nós aqui do Selecionamos cinco vencedores do Nobel que, como você vai ver, mereciam devolver seus prêmios. Confira:
1 – Fritz Haber
O químico alemão Fritz Haber recebeu o Prêmio Nobel de Física em 1918 por sua descoberta de como sintetizar a amônia a partir de nitrogênio e hidrogênio para utilizá-la como fertilizante. Como resultado, ocorreu um dramático aumento na produção mundial de alimentos e, atualmente, metade dos cultivos de todo o mundo depende do método de produção de adubos desenvolvido por Haber. Genial, não é mesmo?
Só que Haber também tinha um lado negro... Durante a Primeira Guerra Mundial, o químico começou a desenvolver formas de utilizar o cloro nos campos de batalha e, em 1915, ele acompanhou pessoalmente o envio de 6 mil cilindros de gás que foram utilizados para matar mais de mil soldados franceses e argelinos em menos de 10 minutos.
2 – Johannes Fibiger
Em 1926, o cientista dinamarquês Johannes Fibiger foi agraciado com o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina por sua descoberta de um parasita que podia provocar o câncer. Inclusive, na época se acreditava que a sua pesquisa consistia na maior contribuição para a medicina experimental de toda aquela geração — só que não.
O dinamarquês conduziu seus estudos em ratos com pequenos tumores em seus estômagos que ele acreditava serem ocasionados por vermes parasitas. No entanto, pesquisas posteriores revelaram que, embora seja verdade que determinadas infecções possam resultar no surgimento de alguns tipos de câncer, o que Fibiger observou nos animais eram inchaços provocados pela deficiência de vitamina A decorrente da infestação pelos vermes.
3 – William Shockley
Além de receber o Prêmio Nobel de Física em 1956 por sua colaboração na pesquisa sobre semicondutores e pelo desenvolvimento do transistor, William Shockley também foi, de certa forma, responsável pelo surgimento do Vale do Silício — quando fundou sua companhia de semicondutores em Palo Alto, na Califórnia. No entanto, apesar da carreira brilhante, o físico conseguiu macular a própria reputação com algumas declarações bem polêmicas.
Shockley era racista e defendia os princípios da eugenia — baseada na ideia de que algumas “raças” são superiores a outras. Segundo ele, os afro-americanos eram inferiores aos norte-americanos brancos, e as diferenças intelectuais entre as duas etnias serviam de prova de que a inteligência e a capacidade intelectual são fatores genéticos.
E como se essa declaração não fosse absurda o suficiente, Shockley ainda acreditava que o maior índice de reprodução entre os afro-americanos exercia um efeito regressivo na evolução. Para piorar, o físico também propôs soluções para o “problema”, sugerindo que o sistema de auxílio do Governo dos EUA deveria ser substituído por ajudas financeiras que permitissem que indivíduos geneticamente inferiores fossem esterilizados!
4 – Joshua Lederberg
O médico norte-americano Joshua Lederberg foi laureado com o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1958 graças à contribuição de sua esposa, a microbiologista Esther Lederberg. Aliás, sem ela, Joshua não teria recebido prêmio nenhum — devido ao seu trabalho em genética bacteriana e recombinação genética — e, injustamente, além de ela não compartilhar da homenagem com o marido, seu nome mal foi mencionado durante o discurso de agradecimento.
Esther descobriu um vírus que infectava bactérias e, em parceria com Joshua, desenvolveu um método de transferir os microrganismos de uma placa de Petri para outra. Ela teve a ideia de usar a esponjinha de seu pó compacto para coletar as bactérias e depositá-las nos recipientes utilizados no laboratório, e até hoje uma técnica muito parecida é utilizada no estudo de resistência a antibióticos. No entanto, ela não teve qualquer reconhecimento por sua contribuição.
5 – Kary Mullis
Em 1993, Kary Mullis recebeu o Prêmio Nobel de Química por desenvolver a reação em cadeia da polimerase — uma técnica que permite a amplificação e criação de várias cópias de DNA sem que seja necessário usar um organismo vivo — e, basicamente, por introduzir uma verdadeira revolução na área da pesquisa biológica e médica.
Assim, muita gente acha surpreendente que o bioquímico seja um entusiasta da astrologia, que ele tenha contado que teve um encontro com um alienígena — que parecia um texugo brilhante —, e que ele tenha admitido publicamente que era chegado ao LSD. Mas essas não são as alegações mais impressionantes vindas da boca de Mullis.
O cientista é um grande defensor das teorias do biólogo molecular Peter Duesberg, que afirma que o vírus da imunodeficiência humana — o HIV — é inofensivo. Para Mullis, a AIDS seria provocada pelo uso de drogas e também pelos medicamentos empregados no tratamento da doença, apesar da enorme quantidade de evidências que apontam o contrário.
Bônus
James Watson
Como você sabe, James Watson é um dos descobridores da estrutura de dupla hélice do DNA — pela qual ele foi agraciado com o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1962. No entanto, apesar de ser genial, Watson já causou muita polêmica graças aos disparates ofensivos que ele já soltou em público.
Certa vez, durante uma palestra na Universidade de Berkeley, Watson teria dado a entender que existem ligações bioquímicas entre a massa corporal e a ambição, assim como entre a cor da pele e a libido — explicando que esse seria o motivo de os latinos serem “calientes”. Não achou os comentários absurdos ainda? Então espere!
Watson também teria dito que “pequenas doses de antissemitismo são justificáveis” e que ele era pessimista com respeito ao futuro da África, já que “todas as políticas sociais que temos estão baseadas no fato de que os africanos são tão inteligentes como nós — o que todos os testes dizem que não é verdade”. Acredita nisso?!
E assim como Joshua Lederberg, Watson nunca deu qualquer crédito aos trabalhos de Rosalind Franklin, cujo trabalho com a cristalografia de raios X permitiu que ele descobrisse a estrutura de DNA.