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terça-feira, 11 de julho de 2017

Sete documentários incríveis escondidos na Netflix

Amy, Kurt, David Blaine, Senna, Maradona e o maior recordista do jogo da cobrinha. Eles têm algo em comum: protagonizam documentários perfeitos.



Amy
Depois de dar à vida de Ayrton Senna um contorno ainda mais épico do que ela já tinha, o diretor Asif Kapadia debruçou-se sobre as filmagens de arquivo de outro ídolo que morreu jovem: Amy Winehouse. A imensidão desse arquivo ajuda. Tudo começa com uma Amy adolescente, gordinha. Insatisfeita com o corpo, ela já aparece em vídeos de família dando os primeiros sinais do transtorno que a acompanharia para o resto da vida: a bulimia. Uma grande decepção amorosa, álcool, heroína e crack protagonizam o segundo ato. No final, uma tese chocante sobre a causa real da morte da melhor cantora desta geração.


Hitler – A Carrier
Se tem um assunto sobre o qual você acha que já viu tudo, esse assunto provavelmente é o nazismo. Mas você nunca viu nada parecido com este documentário de 1977, que chegou ao Netflix neste ano. Como tantos outros documentários, ele retrata a ascensão e a queda do ditador, mas com um diferencial: imagens inéditas dos primeiros discursos em Munique, na década de 1920, narrativa que vale por uma daquelas biografias de mil páginas e uma profusão de filmagens a cores, boa parte mostrando o Führer em momentos de lazer com Eva Braun, sua amante. Mais do que meras curiosidades, essas imagens coloridas nos lembram que o nazismo é algo mais próximo da nossa realidade do que os filmes em preto-e-branco da época nos fazem crer.



Man Vs Snake
Tim McVey ganha mal, mora num fim de mundo, tem um trabalho insuportável, pesa uns 200 quilos e já passou dos 40 anos. Mas tem um trunfo: aos 16, fez um bilhão de pontos num jogo de arcade do início dos anos 80, o Nibbler (precursor do “jogo da cobrinha”, aquele que você jogava no seu Nokia na sala de espera do dentista). O recorde lhe deu uma certa fama nos meios ultra-nerds – pudera: a única forma de fazer o tal bilhão de pontos era jogar por mais de 35 horas seguidas. No início deste documentário, ficamos sabendo que McVey tem um arquiinimigo, que ele nem conhece pessoalmente: Enrico, um jovem da Itália que teria batido seu recorde, ainda na década de 1980. Dali para a frente acompanhamos a paranoia de McVey para tentar recuperar sua marca, e o sentido de sua vida. O resultado dessa jornada insana vale por um ano de terapia – tanto para Tim McVey como para quem assiste.


Este documentário é uma antítese de Pelé Eterno. A obra definitiva sobre o Rei é uma coleção de ótimas imagens de arquivo entremeadas por cenas de uma breguice constrangedora (a parte sobre as conquistas sexuais de Pelé é um bom antídoto contra envenenamento – faz vomitar). Aqui é o oposto: as imagens de arquivo não são essas coisas, mas a narrativa é de primeira linha, feita por um cineasta com pegada independente (que você pode ou não gostar, mas que não tem como ser chamada de brega). Depois de assistir, fica difícil não concordar com a opinião de Tostão: Pelé jogou mais, mas Maradona era mais habilidoso. No mundo dos documentários, acontece mais ou menos a mesma coisa: Pelé Eterno é mais útil para quem quer conhecer o futebol do Rei, mas a habilidade do cineasta sérvio é bem maior que a dos responsáveis pelo documentário brasileiro. Ponto.


Kurt Cobain: Montage of Heck
Se Senna e Amy parecem ficção, de tão redondos, este documentário vai mais longe. Kurt aparece ainda bebê, em vídeos de família. Vemos até ele ganhando sua primeira guitarra de brinquedo. Vinte e poucos anos depois, mais vídeos de família: Kurt e Courtney Love, sua companheira, se filmam em quartos de hotel, chapados de heroína, enquanto brincam com a filhinha Frances Bean. Mas não é só pelas imagens íntimas que este documentário vale. Seu grande trunfo é ser uma biografia analítica, que, busca traçar os episódios que deram origem ao comportamento perturbado de Kurt. Comportamento que culminaria num suicídio aterrorizante.


Real or Magic
David Blaine pede para uma mulher vendar os olhos. Então toca nos ombros do marido dela, que está bem ali na frente. E ela sente o toque, por “telepatia”. Esse é um dos vários truques do mágico mais famoso do mundo. Esse tipo de ato, porém, sempre carrega um peso: a falta de credibilidade. Tudo pode ser só armação. Mas aqui Blane não deixa espaço para isso: os voluntários neste doc são basicamente as maiores celebridades do mundo. O truque do toque nos ombros acontece com Will Smith, sob o testemunho estupefato da família toda do sujeito. Em seguida, vem uma torrente de mágicas, agora com Woody Allen, Robert de Niro, Harrison Ford, Stephen Hawking… Gente que nunca, jamais, nem sob tortura, participaria de uma armação. Destaque para a cena em que Blaine rouba o relógio de George W. Bush sem que nem ele nem seu séquito de assessores percebam, e depois mostra as imagens do furto em câmera lenta. Gênio.



Senna
Quando este documentário estrou nos EUA, houve quem saísse da sala de cinema às lágrimas, chocado com o final: 99% dos americanos jamais tinha ouvido falar em Ayrton Senna, então não faziam ideia de que o herói da história morria no final, num final de semana macabro (outro piloto, o austríaco Roland Ratzemberger tinha morrido nos treinos de sábado, também diante das câmeras). Os brasileiros que acompanharam os três anos em que Ayrton e Alain Prost disputavam curvas ombro a ombro não sabiam, mas estavam assistindo ao maior momento da história do automobilismo. Editada pelo documentarista inglês Asif Kapadia, a disputa entre o brasileiro e o francês ganha um tom homérico, que passava um tanto batido para quem assistia tudo ao vivo. Falo por mim mesmo: o início do GP do Japão de 1990, em que Senna enfia sua McLaren na lateral da Ferrari de Prost logo na largada, provocando um acidente, pareceu só uma manobra burocrática, em que Senna preferiu garantir o título ali mesmo, já que se Prost não marcasse ponto nenhum o campeonato era dele, do que se dar ao trabalho de correr 53 voltas. Neste documentário, porém, a batida não parece uma disputa entre dois jovens esportistas bem pagos pela indústria do tabaco, que patrocinava o grosso da Fórmula 1. Parece é uma batalha entre Aquiles e Heitor, da mitologia grega. Um jogo de intriga e vingança entre semi-deuses. Um drama além da vida e da morte. E, caramba. Não é que foi exatamente isso?