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quarta-feira, 26 de maio de 2021

eu odeio o final de o diabo veste prada

Talvez em 2007 ninguém tenha percebido, mas o Nate é o verdadeiro vilão dessa história toda, e que merda foi aquela no final?



"O Diário Veste Prada" segue sendo uma das minhas comédias românticas favoritas dos anos 2000 - e talvez de toda a história do gênero; todavia, os anos se passaram e assim como quando eu assisti pela primeira vez, eu sigo odiando aquele final - e o fato de ele ser tão real - e tudo que ele representa. É desmotivador e extremamente injusto.

Miranda é apenas um expoente, e ela é bem diferente do que você pensa que ela é...

A construção desse longa se dá pra que Miranda, aqui brilhantemente interpretada por Meryl Streep, seja vista como a Vilã. A personagem é amarga e azeda demais pra ser amada, mas fashionista e lacradora demais pra ser odiada. Cheia de complexos, camadas e lacunas, é fácil entender o seu jeito durão e arrogante de se comportar. Em dado momento fica parecendo que Miranda e Andy (Anne Hathaway) possuem muito em comum, e que no passado Miranda foi alguém tão confusa e perdida quanto sua nova funcionária (des)favorita. Miranda, mesmo depois de realizada, ainda parece estar frustrada - tá no olhar dela. Seu casamento parece ruim, sua vida pessoal parece estar sempre em trilhos finos e suas questões são ignoradas pela mesma que suprime tudo, deixando de perceber o que existe à sua volta e também deixando de percebe-se, para colocar o seu trabalho e status quo acima de qualquer coisa. Miranda não parece ser uma mãe presente, ela não é uma boa amiga, não é uma boa chefe, não é uma boa esposa, não é uma boa pessoa e tudo isso faz a Miranda uma perfeita personagem. Nada está certo com ela e é bem verdade que seu relacionamento com Andy era uma versão menor de Chernobyl, mas ela não é verdadeira vilã desta história. 

Tudo mundo que viu esse filme na época, por mais que não tenha a odiado, de fato, a olhou como se: "ual essa mulher é a megera da coisa." "ela quase estragou o relacionamento a personalidade da mocinha" "por culpa dela a mocinha quase traiu o namorado e esqueceu os amigos." 

Vale lembrar, que embora apenas uma personagem, Andy representa um arquétipo social existente e também é uma pessoa no que se insere, e todas as escolhas que toma durante o desenvolvimento do longa são suas. Miranda não a estava influenciando totalmente. Embora ela quisesse chamar a atenção da patroa e se provar mais do que era enxergada, ela se sentia bem naquelas roupas, sentia-se feliz naquele universo que era seu sonho. Mesmo que ela tenha criado expectativas sobre Miranda, em paris (isso porque ela quis, pois bem sabia de como era a personalidade dela) e depois se decepcionado com o golpe que Nigel (Stanley Tucci) leva da mesma, isso não era o suficiente pra lagar um emprego que podia levá-la para uma revista importante: como a Vogue, Elle ou Glamour. 

pra falar a verdade Andy está cercada de gente tóxica

Andy desistiu de tudo simplesmente por que foi diminuída e desencorajada por aqueles que deveriam apoiar seus sonhos e escolhas, independente de qualquer coisa. Constantemente, os que se diziam seus amigos, estavam caçoando do seu trabalho, seja por estar ocupada demais ou por receber ligações da Miranda no meio do rolê. Eles não estavam preocupados de fato se Andy estava cansada ou sendo abusada de alguma forma, ELES ESTAVAM PREOCUPADOS SE ANDY ESTARIA ALI PRA ELES. UNICAMENTE PRA LHES ATENDER.  E a coisa só muda quando Andy leva alguns presentes caros pra estes "amigos" que se de repente mudam um pouco do discurso defendido, até há pouco. {ela estava literalmente comprando o apoio deles}  

Enquanto isso no ambiente de trabalho, Andy precisa tentar lidar com a amargura e pirraças de Miranda, com a inconstância e inveja de Emily (Emily Blunt) e os risinhos irônicos de Nigel. Todavia, depois de inserida neste mundo glamoroso, Miranda abre-lhe uma porta maravilhosa para o mercado de trabalho, Emily decide apoiar a nova amiga, ainda que às vezes com frases ácidas, e Nigel tenta de um tudo pra tornar tudo mais fácil pra aspirante. Tudo isso não muda fato deles serem tóxicos, mas muito menos que "seus amigos de verdade."

Nate é simplesmente insuportável e tudo dá errado por causa dele

Lá trás, quando lançado, muito gente suspirou de amores porque Andy abria mão do luxo e do gliter pra viver ao lado do seu namoradinho: TODO MUNDO ACHANDO INCRÍVEL QUE A COITADA TENHA FUCKING DESISTIDO DE SEUS SONHOS PRA FICAR AO LADO DE UM CARA QUE EXIGIU ISSO OU O RELACIONAMENTO IA ACABAR.

Nos olhos de 2021, Nate (Adrian Grenier) é simplesmente o tipo de namorado que toda garota, ou garoto, deve evitar. É o mais claro exemplo do abuso passivo - isso pra não dizer claramente abusivo - onde lentamente somos envolvidos por brandas ameaças até que então cedemos tudo pra então ficarmos a mercê das vontades de um (a/e/x) manipulador, que dali pra frente ditará cada passo das nossas vidas (isso é se nos for permitido dar algum.)

Depois de se frustrar com Miranda, Andy entra num processo de reflexão: "será que é com este tipo de gente que eu quero ser associada?"

Mas Andy sabia que Miranda não iria indicar Nigel, pois sabia que aquele mundo era um jogo de caça e rato. Miranda precisava manter seus inimigos bem próximos, pra que não viesse ser desamparada mais tarde. Foi injusto confabular que Miranda iria prestigiar Nigel, com James (Daniel Sunjata) em seu caminho. Andy se frustrou porque queria se frustrar. Ela estava apenas procurando um motivo, uma situação, circunstância pra sair dali correndo e voltar pros braços do seu abusador. 

Não há culpa em Andy, mas também não há em Miranda. A culpa de tudo é toda de Nate. O namoradinho não deu trégua um segundo se quer desde que Andy começou a trabalhar na agência de Miranda. Ele fez a caveira da mulher. Ele aproveitou de todas as formas e deleitou-se em todas as situações possíveis, de maneira tendenciosa, pra fazer com que Andy visse uma Miranda que ele criou - e talvez a direção do filme tenha um pouco do seu male-gaze (olhar machista.) Contudo, por mais que Andy estivesse vendo uma Miranda totalmente demonizada e disfuncional esta não foi a maior causa da sua fuga.

Andy não se sentia suficiente praquele mundo (quando a própria Miranda disse que era - e meus caros se a Miranda não fosse referência no ramo não sei mais poderia ser). Como se fosse desajeitada ou simples demais pra toda aquela coisa - o que não é nenhuma verdade - e sentindo-se diminuída ela decide de afastar. Mas essa insegurança não nasce de Andy, pelo contrário, acompanhamos quase todo o longa uma Andy determinada e capaz de tudo pra chegar onde quer. Esse sentimento de insuficiência nasce de Andy. Quem aqui lembra quando ele duvidou que ela tenha sido contratada e insinuou que ela tenha sido contratada pelo telefone? SIM ELE ESTAVA FALANDO DESSA FORMA DA APARÊNCIA DA PRÓPRIA NAMORADA. Fora isso, durante todo o longa, vemos um namorado desmotivador, agorento e que deseja, quase resfolegando a relinchar, que tudo dê errado pra ela. Ele quer colocar Andy no local de incapaz, de que pra ela só existe o menor. 

Mas por que o menor?

Nate, muito provavelmente, sentia-se diminuído. Afinal para um marmanjo vivendo às custas de um relacionamento e dos amigos - abusivos - da namorada, ver a mesma crescer de maneira independente e se tornar requisitada no mercado de trabalho provava seu fracasso. Ele se irritava toda vez que Andy estava feliz porque algo havia dado certo. Ele usava seus argumentos pra convencer a namorada de que ela estava se tornando uma nova espécie de Miranda.

*ok, talvez este tópico tenha sido muito afetado, mas isso não o desconfigura como real*



uma nova espécie de Miranda...

Andy, apesar de admirar a garra de Miranda como profissional, sentia repulsa pelos seus atos mesquinhos e interesseiros. Para Andy, era essencial se afastar de qualquer coisa que lembrasse as atitudes de Miranda. Repelia-se automaticamente. Quando começou a ser colocado em sua cabeça que ela poderia estar se comportando igual a megera, rapidamente ela tomou outra ótica da situação, agora afetada pela perspectiva de Nate. 

Andy sente que isso pesou mais quando a própria Miranda a mostra, que sim, ela havia feito coisas parecidas. Ao responder sobre Nigel, ela aponta um ocorrido anterior com Emily. Mas Andy entendeu errado. Miranda não quis dizer: você é uma vadia má como eu; ela quis dizer: todos nós em algum momento vamos agir por interesse e colocar-nos-emos em cima do outro. E isso é tão real, puxa. Todavia, porém, Andy não queria enxergar dessa forma, e nem conseguira, pois sua visão já estava contaminada. Agora sem avaliar a situação, ela foge, abandonando seu sonhos, simplesmente por cogitar que estava sendo tão brutal como Miranda; apenas porque ela estava sendo tão má como seu namoradinho havia dito que ela seria. 

Arrependida e envergonhada, a nossa protagonista volta pra onde originalmente estava - o nada, cof, digo, um jornalzinho de nada - e terá que recomeçar tudo de novo pra chegar onde estava, algo que provavelmente ela não irá conseguir. O mais triste de tudo é que no fim resta a apenas a frustração de que mais um abusador conseguiu colocar uma vítima no lugar que ele queria, abaixo dele. 

apesar dos apesares, Miranda é melhor que Nate e Andy

Não muito de longe, Miranda observa. E temos a comprovação oficial do que o filme realmente quer falar. Maturidade. Miranda, mesmo sendo uma carrasca, quase vista como uma espécie de Calígula da moda, é quem se mostra totalmente humanizada. Longe da hipocrisia e da insegurança, ela prepara o terreno para a nova jornada de Andy, por quem tinha alguma feição e confiança, não abandonado a oportunidade de uma futura reconciliação. Apesar de se sentir traída e abandonada, Miranda sente-se feliz pela nova caminhada de Andy (e se vê nela no tipo de: eu também precisei passar por tudo isso pra entender como o mundo pode ser cruel). Verdadeiramente Miranda quer o melhor pra Andy, independente do local em que esteja e deixa-nos bem claro isso; diferente de Nate que só quer Andy bem, se este bem-estar for na posição de vulnerabilidade.  

Quando o filme acaba, por fim, temos uma Andy totalmente presa as garras de um predador, um Nate totalmente satisfeito por finalmente conseguir de alguma forma sentir-se validado e uma Miranda ainda frustrada, mas aliviada por saber que Andy se tornou, ao menos um pouco, mais segura do que antes, de quando se conheceram.